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Saiba porque as COPs são importantes e fique por dentro do que rolou na COP 26

Por Elisa Mello


Quando uma crise ataca a todos, sem distinções, está mais que provado que somos capazes de nos unirmos mundialmente. Foi assim (e vem sendo) durante a pandemia da COVID-19 e também tem sido assim no que se refere ao combate das mudanças climáticas. Por quase três décadas, os governos mundiais se reúnem quase todos os anos para forjar uma resposta global à emergência climática. De acordo com a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 1992 (UNFCCC), todos os países da Terra estão vinculados a um tratado para “evitar mudanças climáticas perigosas” e encontrar maneiras de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) globalmente, de forma equitativa. Pode-se dizer que a maior barreira, neste caso, são os interesses econômicos e os entraves políticos. Faz-se urgente, portanto, uma mudança de cultura entre a maioria das nações do globo. Neste sentido, as Conferências das Partes (COPs) chamam a atenção às realidades gritantes e às necessidades urgentes de mudanças em nosso modo de viver como sociedade.


As COPs são importantes porque mantêm vivo o debate e a busca por soluções em relação ao aumento da temperatura do planeta. Elas são, ainda, um espaço de escuta dos povos tradicionais e também dos mais atingidos pelas mudanças climáticas. As COPs sobre a Mudança do Clima tiveram início em 1995. Elas foram elaboradas durante a Conferência das Nações sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada em 1992, no Rio de Janeiro (Rio-92). A COP é o órgão supremo da UNFCCC e reúne, anualmente, os países que assinaram e ratificaram a Convenção e o Protocolo de Kyoto (em 1997), substituído por um novo acordo na COP 21, realizada em Paris, em 2015. Um dos aspectos mais importante das COPs são as NDCs, que são as metas nacionais ou Contribuição Nacionalmente Determinada que envolve compromissos voluntários criados por países signatários do Acordo de Paris. Outro aspecto importante são as PADs, a parte central das negociações que, espera-se, sejam atingidas com base em 3 ações: financiamento do clima, eliminação progressiva do carvão e soluções baseadas na natureza.


Embora, atualmente, o número de cientistas e pesquisadores voltados para as COPs sejam maiores, sabemos, desde 2016, que a conta climática não fecha (entenda esta conta no texto ao lado), sabemos também que 1 bilhão de pessoas sofrerão com calor extremo, caso a temperatura aumente em apenas 2 °C, sabemos que a crise climática está aumentando a combinação mortal de temperatura e umidade. E a verdade é uma só: até 2050, precisaremos gerar o dobro de energia com metade das emissões GEE. Cálculo difícil! Difícil porque o tempo está acabando. E, tanto no âmbito individual quanto no coletivo, ainda há muito o que fazer. Claro, avançamos muito desde a primeira COP e, por este prisma, o Acordo de Paris está dando certo, já que, pela primeira vez desde então, líderes de quase 200 nações desenvolvidas e em desenvolvimento se uniram para debater (e, desta vez, agir com propostas mais concretas), para dar voz aos diretamente afetados e para que um número maior de instituições comece a se importar também.


A COP 26 trouxe um aspecto no avanço do combate às mudanças climáticas quando abordou o tema metano (CH4). O metano é 20 vezes mais poluente do que o dióxido de carbono (CO2) e, por meio de um tratado assinado, mais de 80 países (incluindo o Brasil) pretendem reduzir suas emissões de metano em 30%, até 2030. É sempre importante lembrar que a redução do metano, assim como do dióxido de carbono, são a forma mais rápida que temos de diminuir o aquecimento global. Os cientistas estimam que, se o mundo quiser ter uma boa chance de permanecer dentro do limite de 1,5 °C, as emissões GEE devem ser reduzidas em 45%, até 2030, em comparação com os níveis de 2010, e daí pular para emissões net zero (em que as atividades dentro da cadeia de valor de uma empresa não têm impacto líquido das emissões de carbono sobre o clima), até 2050. E, talvez, o acordo que mais tenha chamado atenção durante a COP 26 foi a mobilização de ativos equivalentes a US$ 130 trilhões em direção à neutralidade de carbono, representando 40% dos ativos financeiros globais. Trata-se da iniciativa GFANZ (Glasgow Financial Alliance for Net Zero), da ONU, chefiada e apoiada pelos grupos Black Rock e Citigroup, e assinada por mais de 450 instituições financeiras. A iniciativa, se desenvolvida de forma correta, pode representar 70% dos recursos necessários para a efetividade da transição para uma economia de baixo carbono.


Falta regulação e monitoramento para que estes recursos sejam de fato direcionados de forma correta. Estamos quase lá? Não. A ONU relatou recentemente que as NDCs atuais, incluindo aquelas que foram recentemente submetidas ou revisadas pelos EUA, UE, Reino Unido e mais de 100 outros países, ainda são inadequadas. Elas resultariam em um aumento de 16% nas emissões GEE, longe do corte de 45% necessário. As temperaturas ao redor do mundo já estão em cerca de 1,1 - 1,2 °C acima dos níveis pré-industriais, e as emissões GEE ainda estão em uma tendência ascendente. A produção de CO2 despencou durante o isolamento e bloqueios gerados pela pandemia, em 2020, mas isso foi temporário e elas aumentaram novamente desde que as economias se recuperaram. Para ficar dentro de 1,5 °C, as emissões globais precisam cair cerca de 7% ao ano nesta década. E é por isso que cientistas e políticos na COP estão chamando a década de 2021 a 2030 de a década crucial para o clima - se as emissões forem reduzidas rapidamente, podemos evitar que as emissões cumulativas cresçam muito e ainda teremos uma chance de ficar dentro de 1,5 °C.


Outro marco da COP 26 foi o “Forest Deal”, assinado por 105 países (Brasil inclusive), que prevê o fim do desmatamento até 2030. O acordo espera preservar 85% das florestas do planeta por meio de investimentos de quase US$ 20 bilhões, entre governos e empresas privadas, que buscam direcionar seus recursos para proteger e restaurar florestas de diversas formas. O valor inclui US$ 1,7 bilhão para povos indígenas. Importante destacar que o compromisso assinado não é vinculante e não apresenta ainda metas ou caminhos claros para impedir o desmatamento. Na COP26, os países também trataram de encontrar uma resposta para o enigma do comércio de carbono, por meio do qual as nações podem compensar sua própria poluição pagando por cortes em outros lugares. Funciona assim: uma tonelada de dióxido de carbono tem o mesmo impacto na atmosfera, onde quer que seja emitida, então se for mais barato cortar uma tonelada de dióxido de carbono na Índia do que na Itália, o governo italiano ou as empresas poderiam pagar pelos projetos - painéis solares, por exemplo, ou um parque eólico - na Índia, isso reduziria as emissões lá e contabilizaria esses “créditos de carbono” em suas próprias metas de redução de emissões. Dessa forma, os países pobres ganham acesso a financiamentos necessários para os esforços de redução de emissões GEE, e os países ricos enfrentam menos um fardo econômico para reduzir o carbono. Essa pode ser uma maneira vital de cortar carbono de forma eficiente ou uma fraude para atrasá-los, dependendo do ponto de vista. Assim, o sistema é inadequado em qualquer caso em um mundo onde todos os países, desenvolvidos e em desenvolvimento, devem cortar seu carbono o mais rápido possível. O comércio de carbono foi incluído no Artigo 6º do Acordo de Paris, mas os conflitos sobre como implementá-lo ainda precisam ser resolvidos.


A COP 26 foi crucial também para fazer a transformação do mundo baseado em energia fóssil para as energias renováveis. O custo da energia renovável e de outras tecnologias verdes despencou nos últimos anos, de modo que agora é tão barato quanto os combustíveis fósseis na maior parte do mundo. A tecnologia dos veículos elétricos também progrediu rapidamente e novos combustíveis, como o hidrogênio verde, estão sendo desenvolvidos. Mas, desde a revolução industrial, quase toda nossa prosperidade e tecnologia foram construídas com base em energia de combustíveis fósseis barata e de fácil acesso. O fim desse reinado exigirá grandes mudanças nos sistemas de energia, no ambiente construído, nos transportes, no nosso comportamento e na nossa dieta. Na COP 26, 24 países e 41 cidades (incluindo cidades brasileiras) anunciaram o fim dos veículos movidos a combustíveis fósseis, até 2040. Fazer com que concordassem com algo tão complexo não foi fácil.


Sobre o uso de carvão, o pontapé inicial foi dado: mais de 40 países se comprometeram com o fim do uso do carvão. Mas China e EUA não se manifestaram. Glasgow não debateu apenas a crise climática, como também a perda de biodiversidade e dos biomas. Desta forma, os países se reuniram para um conjunto paralelo de negociações sobre como conter a perda de espécies em extinção ou ameaçadas, como restaurar ecossistemas naturais e proteger o oceano. Eles chegarão a uma conclusão em abril próximo, em uma reunião presencial, com negociações virtuais que ainda estão em preparação. O que está em jogo agora é a transparência, e como será aplicado o código para verificações regulares lideradas pela ONU sobre o cumprimento das promessas acordadas pelos países. Isso é visto como a espinha dorsal da COP 26. Questões como o comprometimento de os países concordarem em aumentar suas metas de redução de emissões GEE a cada ano, ao invés de a cada cinco; ou o comprometimento da ajuda de mais de US$ 100 bilhões, por uma década, para financiar o desenvolvimento limpo em países de baixa renda, e aumentar o valor no futuro, são questões difíceis, mas que importam para que a crise climática acabe. A transparência será a alma do negócio, pois não é possível enganar a física atmosférica, nem a natureza, nem a ciência. Portanto, não importa o ideal político, o mundo tem que vencer essa corrida de forma limpa e rápida.


O oceano pode ser um grande aliado nessa luta. Afinal, ele absorve grande parte do CO2 liberado na atmosfera, seja por algas marinhas - que são responsáveis pela produção de 50% do oxigênio que respiramos -, seja por áreas costeiras alagáveis, como manguezais e marismas - que absorvem de 2 a 4 vezes mais carbono que as florestas terrestres. Ainda que crescente, essa relação clima-oceano ainda é pouco debatida nas COPs do clima. Além disso, uma boa parte das pessoas extremamente afetadas pelos efeitos das mudanças climáticas são populações de pequenos estados insulares e zonas costeiras, que sofrem desproporcionalmente com o aumento do nível do mar e tempestades cada vez mais intensas e agressivas. Assim, é urgente a necessidade de se comunicar e fazer advocacy para que as agendas de oceano e clima sejam cada vez mais convergentes.


Este texto foi escrito por Elisa Homem de Mello, jornalista ambiental e colaboradora de conteúdo da Liga das Mulheres pelo Oceano.

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