Por Leandra Gonçalves
Para quem luta pelo meio ambiente, todo dia é dia de lutar por um ambiente mais equilibrado e justo. Todo Dia do Meio Ambiente é um dia de refletir. E, por isso, essa semana algumas imagens ficaram indo e vindo na minha mente.
A primeira delas é o embrulho no estômago e as noites sem dormir que senti quando o Congresso desmantelou e desmontou a estrutura ambiental. Sei que muitos de vocês também sentiram. O texto aprovado esvaziou o Ministério do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. A pasta do Meio Ambiente perdeu a administração do Cadastro Ambiental Rural (CAR), transferida para a pasta da Gestão, e da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), que passou para o Ministério da Integração e Desenvolvimento Nacional. E eles foram ainda mais longe, retirando do Ministério dos Povos Indígenas a atribuição de demarcação de terras indígenas. O texto também estuda conceder ao Ministério de Minas e Energia autoridade para emitir licenças especiais em casos de "interesse nacional". Tais mudanças podem causar grandes retrocessos nas ambições ambientais do Brasil e comprometer a reputação internacional do país nas áreas socioambiental, de direitos humanos e de mudanças climáticas. Isso vai totalmente na contramão dos esforços globais.
Nessas duas semanas eu e muitos outros companheiros testemunhamos o desmonte, mas também nos movimentamos. Refletimos, nos organizamos e fizemos o que era possível para denunciar. Escrevemos artigos de opinião, participamos de audiências públicas, demos entrevistas escancarando tamanha atrocidade. Quem tinha contatos no governo, usou. Quem não tinha, usou outras ferramentas. Teve encontro de comunidades e lideranças costeiras e extrativistas com presença de Ministras e demandas claras por mudanças. Avançamos. Sabemos quem somos e o que queremos. Ver todo mundo se movimentando dá um quentinho no coração e um orgulho tremendo da minha linda e forte bolha. Obrigada por estarmos juntos. Mas, nada disso me trouxe acolhimento: segui com a mente e o coração inquietos.
Quando olho ao redor, parecemos muitos. Mas, quando lembro serem quase 215 milhões de brasileiros e brasileiras, penso que somos POUQUÍSSIMOS em movimento. Para um dia revertermos a escala de destruição planetária, precisamos de muitos mais. Precisamos de mais gente, de todo mundo. Precisamos de batalhões espalhados do Sul ao Norte. Onde estamos nós? Onde estão vocês que não estão ocupando as ruas diante de tamanho descalabro? Onde estão aqueles que votamos que não estão do lado do ambiente, e nem mesmo do nosso lado?
A música e a arte inspiram. Meus alunos não conheciam a letra de "Sal da Terra", de Beto Guedes, mas essa semana eu ouvi novamente para me lembrar que:
"Vamos precisar de todo mundo
Um mais um é sempre mais que dois
Para melhor construir a vida nova
É só repartir melhor o pão
Recriar o paraíso agora
Para merecer quem vem depois"
Me trouxe força e esperança. Essa semana também assisti o “Vale dos Isolados”. O filme conta a história de Bruno e Dom, o indigenista e o jornalista inglês que foram executados, vítimas de uma emboscada na Amazônia – um crime que repercutiu no mundo inteiro, e que completa um ano hoje. E o mesmo sentimento de embrulho no estômago voltou. Por que somos tão poucos? Onde está o Estado que deveria garantir um meio ambiente equilibrado? Que deveria garantir direitos humanos, que deveria lutar ao nosso lado e nos proteger.
No dia seguinte, fui à praia e fiquei vendo ondas bem pequenas chegando na areia. Elas sempre vinham. A constância trazia paz. Uma a uma, estavam se movimentando. Mas eram fracas e ainda não o suficiente para levar o surfista que esperava a melhor onda para dropar. Somos como essas ondas. Estamos nos movimentando. Mas ainda somos poucos, e embora juntos estejamos mais fortes, ainda não o suficiente para mudar o rumo de um país. Precisamos ir às ruas. Precisamos de mais gente.
Ver que ainda não somos o suficiente é uma realidade que me embrulha o estômago. Tem dias que a gente cansa, e precisa descansar para enfrentar a luta que vem no dia seguinte. Tem dias que as boas notícias e ações revolucionárias que vemos por aí nos animam a seguir em frente. Foi lindo ver um dia do meio ambiente com as ministras do Meio Ambiente, Marina Silva, dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara e outras lideranças ambientais, como o Cacique Raoni Metuktire. Aqueceu o coração. Tiveram anúncios importantes. Mas, ainda não é o suficiente para dar conta da destruição histórica da nossa sociobiodiversidade.
Apesar de querer comemorar o Dia do Meio Ambiente depois de quatro anos sem comemoração, estou enfrentando essa semana com uma análise bem pessimista. Mas, como a Pollyana que habita em mim é bem resiliente, eu sigo realizando ações bem otimistas e trabalhando pelo que acredito. Sigo encontrando meus amigos, aplaudindo e vibrando pelos que estão fazendo alguma coisa, ouvindo ideias reflexões e tendo ideias que possam estimular pessoas a se juntarem. Quem sabe a maré muda, e as ondinhas viram um tsunami! Precisamos de todo mundo. O dia do meio ambiente foi ontem, mas, ainda temos a semana, o mês, o ano, e a nossa existência para lutar por um mundo melhor.
As músicas estão aí para nos inspirar, já dizia o poeta Raulzito:
“Nunca se vence uma guerra lutando sozinho
Você sabe que a gente precisa entrar em contato
Com toda essa força contida é que vive guardada
O eco de suas palavras não repercutem em nada
É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro
Evita o aperto de mão de um possível aliado, é
Convence as paredes do quarto, e dorme tranquilo
Sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo
Coragem, coragem
Se o que você quer é aquilo que pensa e faz
Coragem, coragem
Eu sei que você pode mais
(...)”
Esse texto foi escrito por Leandra Gonçalves, e se você quiser se inspirar, tem uma playlist para você aqui sobre meio ambiente. Escute e contribua com outras músicas para inspirar mais gente a seguir nessa onda:
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