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  • Isabela Moreira

Como é viver no modo de resiliência climática?

Atualizado: 5 de jul. de 2021

Reunimos mulheres que vivem essa realidade no seu dia a dia para compartilhar as experiências no mar no painel “A vida no modo resiliência climática e o impacto do plástico no mar” . Daniela Lerario, Heloisa Schurmann, trazem também o olhar sobre como o Oceano se transformou com as toneladas de plástico despejadas todos os dias. É desse choque que surgem soluções, porque o desafio é imenso mas as oportunidades também.


ENTREVISTA com Heloisa e Daniela


"À beira de uma crise hídrica que pode ter consequências imensuráveis econômicas, o tema água volta ao centro das discussões mas, infelizmente pelo viés da escassez, apesar da abundância do nosso país. Por isso consideramos inspirador ouvir mulheres que vivem o Oceano e estarão no Summit Blue-ing the Circular Economy para compartilhar o que é viver no modo resiliência climática. Um dos pontos, claro, é rever a nossa relação com a água, compreender esse ouro que não nos chega de graça e sem esforços. É preciso cuidar para que as gerações futuras também se beneficiem dessa riqueza".


Heloisa Schurmann é uma conhecida autora brasileira de cinco livros, entre eles, sua primeira obra infanto-juvenil "As Aventuras de Formiga e Capitão" e “Expedição Oriente – 812 dias de uma volta ao mundo”; obras mais recentes, e dois best-sellers, incluindo “Pequeno Segredo”, lançado na Itália e no Brasil. Cursou inglês na New York University e se especializou em Pedagogia. Durante a expedição Magalhães Global Adventure, desenvolveu o Programa Pedagógico Educação na Aventura, acompanhado por mais de 2 milhões de alunos no Brasil e nos Estados Unidos. Velejadora e mãe da Família Schurmann (primeira família brasileira a dar a volta ao mundo a bordo de um veleiro), educou os filhos Pierre, David, Wilhelm e Kat em duas das (até o momento) três expedições marítimas, visitando 64 países e os cinco continentes (Américas, Europa, África, Ásia e Oceania, além da Antártida). Pesquisadora, contribui também no núcleo de dramaturgia da produtora. Palestrante, vem se apresentando para grandes corporações, universidades e eventos públicos no Brasil e no exterior. Inspiradora, em 2017, Heloisa se apresentou no TEDx Educação em São Paulo para um público de 10 mil pessoas. Durante suas circum-navegações, se tornou ativista ambiental e vem trabalhando junto com a família na conscientização sobre a poluição dos plásticos nos oceanos. É defensora da campanha #MaresLimpos do Programa das Nações Unidas pelo Meio Ambiente, que apoia mundialmente a próxima grande expedição da Família Schurmann: Voz dos Oceanos – com início previsto para agosto de 2021.


O que mudou na sua relação com a água desde começou a viver o Oceano?


Nós sempre tivemos muito respeito pelos recursos naturais e pelo meio ambiente. Mas, em 1984, quando o veleiro e os oceanos do planeta passaram a ser literalmente a nossa casa, ampliamos ainda mais nossa conscientização de se valorizar esses recursos e respeitá-los preservando-os da melhor maneira possível. Há quase 40 anos, quanto partimos para a nossa primeira volta ao mundo, não tínhamos um dessalinizador, água potável e doce era um recurso muito precioso! Nossos 4 filhos cresceram com essa consciência, porque a gente sempre foi bem rigoroso com cada gotinha utilizada de forma adequada, sem desperdício. No veleiro Kat, temos dessalinizador. Ainda assim, mantemos o mesmo rigor e cuidado. Até porque conhecemos povoados, em ilhas muito distantes, que dependem das chuvas para ter água dessalinizada. Então, com o tempo, a nossa relação e respeito com a água vem se intensificando cada vez mais. A água é o “alicerce” da nossa moradia, o nosso quintal, nosso local de lazer e de trabalho, nossa estrada que nos leva para tantas aventuras.


O que é viver no modo resiliência climática?

Por diferentes motivações ou justificativas, nossa raça humana foi tão agressiva e desrespeitosa com o meio ambiente, né? Gerações e gerações em desarmonia com a natureza, sem pensar nas consequências futuras. Para mim, viver em modo resiliência climática é resgatar essa harmonia com o meio ambiente, um viver que não seja conflitante, um não guerrear com a natureza. É assumir uma missão como a Voz dos Oceanos, que – entre seus objetivos – buscará por soluções capazes de reverter o cenário degradante e sufocante dos nossos oceanos. A invasão plástica dos oceanos vem gerando diversos danos para as espécies, para nós e para o planeta. Lembremos que plástico e micro-plásticos vêm reduzindo a produção de oxigênio nos mares, os verdadeiros pulmões do planeta. Isso potencializa o efeito estufa e suas consequências, como derretimento de grandes áreas de gelo e aumento do nível dos oceanos.


Quando falamos de plástico no Oceano, é difícil se sensibilizar quando parece distante. Como essa questão aparece no seu dia a dia, o que viu de mais chocante até hoje?

O mais impressionante que essa nem é uma questão tão distante assim de todos nós. Ela já afeta, inclusive, a nossa saúde. Mas, de fato, as pessoas se sensibilizam mais quando “visualizam” o problema. A participação em limpeza de praias urbanas já causa um impacto importante. Imagine a reação das pessoas quando participam de limpezas de praias desertas! Em Fernando de Noronha, levamos um grupo de influenciadores para uma praia de acesso restrito e controlado e observamos a reação deles diante de grãos coloridos na areia. Num primeiro momento, eles acharam que aquele colorido era da própria areia. Mas, quando pegaram um punhado nas mãos, viram que eram micro-plásticos misturados na areia e ficaram impressionados como isso podia acontecer numa área preservada. E, a partir daí, compreender melhor todo o ciclo e os efeitos. Vale destacar que esse não é um problema recente. Em 1998, durante nossa segunda volta ao mundo, nos impressionamos com a quantidade de resíduos que encontramos numa ilha remota e deserta do Pacífico, Henderson Island. Ou seja, há mais de 20 anos! Em 2015, durante a Expedição Oriente, tivemos uma experiência semelhante quando chegamos em West Fayu, outra ilha deserta do Pacífico, que tinha sido invadida por plástico de diversas partes do mundo.


Qual o grande desafio para resolvermos a questão do plástico no Oceano?

Uma conscientização e um engajamento mais amplos, passando por diversos setores. Por exemplo: a sociedade civil repensar seus hábitos de consumo e comportamento; as indústrias e as empresas repensarem os materiais utilizados na fabricação dos seus produtos e embalagens; os governos repensarem políticas públicas de coleta e tratamento de resíduos; ONGs e ativistas refletirem como sensibilizar quem está mais distante do tema e precisa se envolver nessa causa; cientistas e startups avançarem em pesquisas que aprofundem o conhecimento e a criação de soluções efetivas, etc. Essa não é a causa de uma pessoa ou de um grupo. É uma causa que deve ser abraçada por todos. Porque não existe jogar fora. Tudo converge para um mesmo lugar: o nosso planeta, onde todos nós habitamos.

Daniela Lerario é bióloga, com experiência em ação climática, gestão de resíduos e economia circular. Atuou no Ministério Público de SP (CAO-UMA), na área de sustentabilidade do Grupo Pão de Açúcar e como consultora independente antes de se juntar à [TriCiclos](https://triciclos.net/pt-br/), Empresa B Certificada da qual é sócia e onde exerceu o cargo de CEO por 3 anos.


Palestrante do TEDxSP https://youtu.be/8VRy9rDeJpM e Live Talks]https://youtu.be/49nMhEiMpQQ, foi a única integrante latino americana da Expedição Pangea que atravessou o Oceano Pacífico em busca dos impactos da poluição de plásticos nos oceanos.


Contribuiu como especialista para a publicação do reporte Breaking the Plastic Wave(https://www.pewtrusts.org/en/research-and-analysis/articles/2020/07/23/breaking-the-plastic-wave-top-findings)’, capa da revista Science em 2020. É e baixadora da eXXpedition https://exxpedition.com/ e residente do 'House of Beautiful Business'.(https://houseofbeautifulbusiness.com/

Mãe de "dois furacões", atualmente integra com orgulho a equipe dos [Climate Champions](https://racetozero.unfccc.int/) como líder da estratégia Brasileira de ação climática e co-líder da equipe de Soluções Baseadas na Natureza, com o propósito de acelerar a ação e ambição dos 'atores não-estatais’ ao cumprimento do Acordo de Paris rumo à COP26.


Faz parte da Governança do Sistema B https://www.sistemabbrasil.org/ desde 2016, onde exerceu os papéis de conselheira (2016-2018) e co-presidente do Conselho (2018-2020). É otimista. Acredita no Brasil, no poder da diversidade e da colaboração e na força dos negócios para a construção de uma economia mais justa, regenerativa e resiliente para todos.



1. O que mudou na sua relação com a água desde começou a viver o Oceano?


Passei a reconhecer água em tudo, em nós mesmos. Perceber seu fluxo, seu ciclo e como ela nos conecta. São interessantes os paradoxos: da abundância e da escassez, da poluição e da pureza. água está em tudo! Hoje tenho enorme respeito e maior consciência da nossa responsabilidade em preservar, celebrar e valorizar este bem essencial à vida.


2. O que é viver no modo resiliência climática?

Construir resiliência climática é algo complexo e, para mim, um aprendizado contínuo. É apostar na constante capacidade de antecipar, preparar e responder a eventos externos que possam afetar a vida e a segurança das pessoas e do planeta, assim como a tendências e distúrbios relacionados às mudanças climáticas.

Exige o exercício disciplinado de enxergar riscos e atuar sobre eles, e de colocar as pessoas e a natureza no centro das decisões - algo que parece simples, mas não é. Sucesso aqui, significa impactar vidas individualmente e cuidar para que a capacidade adaptativa dos sistemas sócio econômicos em absorver impactos negativos e exercer suas funções se mantenha intacta.


3. Quando falamos de plástico no Oceano, é difícil se sensibilizar quando parece distante. Como essa questão aparece no seu dia a dia, o que viu de mais chocante até hoje?

Uma das coisas que me choca é a velocidade com que o plástico chega aos oceanos. Os esforços atuais simplesmente não são suficientes… Mesmo se fizermos tudo que nos comprometemos publicamente a fazer para resolver o problema, só reduziremos o fluxo de plásticos para os oceanos em 80% até 2040, como mostrou o estudo: Breaking the Plastic Wave. É absurdo e desanimador.

A presença de alguns fragmentos específicos se tornou contínua e quase 'previsível na minha interação com o mar e seu entorno. São o sinal claro do que consideramos “erros de design” - não somente do produto, mas de todo o processo (desde a concepção, passando pela distribuição e pelo uso, incluindo a infraestrutura local -incapaz de capturá-los). Ali, nos deparamos com os sujeitos de sempre -e, pode apostar, eles estarão lá: hastes flexíveis, bolinhas flutuantes de poliestireno estendido, tampinhas (de todo tipo), isqueiros, embalagens rígidas ou flexíveis, canudos, linhas de pesca, brinquedos, …. provenientes ou não daquele local (muitas vezes nem conseguimos identificar a origem). E se a gente olha mais de perto: lá estão eles: microplásticos. Que desgosto a primeira vez que os percebi na areia… pontinhos coloridos que se camuflam na natureza e afetam a cadeia alimentar pela base. Assim, aos poucos, vamos criando uma cultura nociva de normalização: onde se começa a ignorar a poluição e viver apesar dela. É de tirar o sono.


4. Qual o grande desafio para resolvermos a questão do plástico no Oceano?

Nenhuma solução vai funcionar isoladamente. O desafio é aplicar o conceito abrangente economia circular que ofereça os melhores resultados econômicos, ambientais e climáticos, reconhecendo as peculiaridades de cada situação.


Para começar, precisamos redesenhar o sistema de plásticos como um todo: imaginar uma economia em que os plásticos que são produzidos nunca se tornem resíduos ou poluição. Essencial tratar a questão de maneira holística, dos oceanos à fonte - e vice-versa. Mas nada disso funciona se continuarmos a colocar plásticos sem valor na economia, se não nos empenharmos na educação e comunicação e se não trabalharmos juntos e implementarmos políticas públicas efetivas em paralelo.


Citando a nova economia para os plásticos da Ellen MacArthur Foundation, três ações são necessárias para alcançar uma outra visão de futuro:

Eliminar_os itens problemáticos e desnecessários

Inovar_para garantir que aqueles materiais que precisamos utilizar sejam efetivamente reutilizados, reciclados e/ou compostados quando sua função chegar ao fim, além da pesquisa por materiais substitutos; e

Circularizar os itens que utilizamos para mantê-los na economia e fora do meio ambiente.

Por fim, penso sempre no nosso poder de voto - as escolhas diárias que são nossas, e de mais ninguém.



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