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Oceano e Direitos Humanos: por uma justiça socioambiental

  • Foto do escritor: Colaboradoras da Liga
    Colaboradoras da Liga
  • 4 de mai.
  • 3 min de leitura

Atualizado: 5 de mai.


Por Natália Grilli


Que o oceano é fundamental para a vida na Terra, você já sabe. Ele produz a maior parte do oxigênio que respiramos, regula o clima do planeta, abriga uma biodiversidade gigante e provê inúmeros serviços ecossistêmicos. Menos conhecido, contudo, é a relação entre a saúde do oceano e o cumprimento e plena realização de direitos humanos fundamentais (figura 1). Embora este seja um tema crescente nos últimos anos, principalmente graças aos movimentos da sociedade civil por justiça ambiental, ainda é bastante restrito a fóruns jurídicos, negociações internacionais, e literatura científica.



Figura 1: Um oceano limpo, saudável e sustentável como um direito humano fundamental. Retirado de Bennet, Morgera & Boyd (2024).
Figura 1: Um oceano limpo, saudável e sustentável como um direito humano fundamental. Retirado de Bennet, Morgera & Boyd (2024).

O tema entrou em pauta recentemente, em abril de 2025, com a aprovação de uma resolução histórica do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (UNHRC). A Resolução A/HRC/58/59, denominada “O oceano e direitos humanos: o direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável”, traz de forma bastante clara que a proteção e regeneração do oceano é um direito humano que deve ser protegido, relata as principais ameaças a esse direito e traz recomendações para que Estados-Nação e setor privado cumpram com suas responsabilidades neste aspecto.


Segundo a Resolução, promover uma abordagem baseada em direitos humanos na forma como governamos o oceano ajuda a valorizar os conhecimentos ancestrais e científicos, promover a saúde e modos de vida de populações indígenas e comunidades tradicionais, proteger os defensores e defensoras do oceano e garantir que futuras gerações também tenham acesso a alimentos de qualidade e um clima seguro e estável. Enfrentar a tripla crise planetária que vivemos, composta pela emergência climática, perda da biodiversidade e poluição, requer essa visão holística e de longo prazo. A Resolução reconhece, ainda, mulheres como “guardiãs marinhas”, por seu importante papel na conservação e sustentabilidade do oceano.


O aproveitamento desse direito, contudo, está bastante ameaçado, principalmente por uma governança fraca e fragmentada, que permite (ou falha em coibir) atividades prejudiciais à saúde do oceano. O documento ressalta que embora existam mais de 600 (!!!) leis e normas institucionais que tratam da relação complexa entre direitos humanos, atividades econômicas e ecossistemas marinhos, elas são pouco efetivas por serem muito fragmentadas, executadas com pouca transparência e falta de uma coordenação integrada entre diversos níveis de governança. 


A isso se soma atividades como: pesca industrial não-sustentável, tanto do ponto de vista da extração de vida marinha, quanto da exploração de trabalhadores em condições deploráveis, e jornadas de trabalho desumanas; urbanização desordenada da costa; mineração de mar profundo; geoengenharia marinha; economia azul não regulada; poluição diversa vinda de fontes marinhas e terrestres; e impactos advindos das mudanças climáticas, como acidificação e aquecimento da água do mar. Tudo isso põe em risco o direito a um oceano limpo, saudável e sustentável e agrava problemas como fome, pobreza, desigualdade social e de gênero, deslocamento forçado de populações e dispersão de doenças.


Para enfrentar essa situação, a Resolução recomenda que Estados desenvolvam e implementem políticas públicas que protejam os direitos humanos contra danos ao meio ambiente marinho, controlando atividades potencialmente perigosas com base nos riscos que oferecem. Como exemplo, a Resolução recomenda a realização de avaliações de impacto ambiental antes de autorizar qualquer atividade que possa poluir ou afetar o oceano, que permitam ampla e efetiva participação social em todas as etapas do processo, considerem o conhecimento científico e tradicional, e o potencial impacto socioeconômico, espiritual, cultural e ambiental, incluindo efeitos transfronteiriços e cumulativos dos projetos em questão.


O setor privado, por sua vez, deve seguir as Diretrizes da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos, que determinam que todas as empresas devem respeitar plenamente os direitos humanos, mesmo que os governos onde atuam não tenham leis específicas nesse sentido. Isso inclui garantir o direito a um meio ambiente saudável, investir no desenvolvimento e capacidade técnica das comunidades, apoiar o acesso à educação e saúde e promover condições de trabalho dignas.


Promover uma abordagem de direitos humanos à governança do oceano é fundamental também para o cumprimento de acordos ambientais multilaterais atuais, como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, a Década do Oceano e o Acordo para a Biodiversidade Marinha Além das Jurisdições Nacionais, e para garantir o sucesso de acordos ainda em planejamento e negociação, como o Tratado Global dos Plásticos, a exploração de minérios em mar profundo, e a Conferência do Oceano de 2025. A abordagem de direitos humanos para a governança do oceano reconhece que um oceano saudável vai muito além da conservação de recursos naturais. Reconhece que a saúde do oceano é indissociável da saúde e bem-estar humanos.





Sobre a autora: Natalia Grilli é integrante fundadora da Liga das Mulheres pelo Oceano e produtora de conteúdo da newsletter. Atualmente, Natália está cursando doutorado na Universidade da Tasmânia (Austrália), no programa de Ciências Políticas e Relações Internacionais. Natalia trabalha com o desenvolvimento de políticas públicas para lidar com a poluição por plásticos, do nível global ao local.
















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