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  • Foto do escritorLeandra Gonçalves

LIGA CONVIDA: A emergência climática e a Agenda 2030 em pauta: Um mergulho no oceano





A vida humana na Terra depende de que respeitemos os limites do planeta. Ao colocar em risco esses limites, as ações humanas geram situações de incerteza para o bem-estar da humanidade o e de todas as outras formas de vida. Um dos limites que está em risco de ser ultrapassado e que vem gerando incertezas em relação ao futuro da humanidade é o clima, sendo definido um cenário de Emergência Climática.




Photo by Iris Bulton Unsplash


A mudança climática é pauta cada vez mais presente no nosso dia a dia: vem sendo associada com os desdobramentos da pandemia, foi considerada o termo do ano de 2019 pelo Dicionário Oxford, foi apontada como um dos maiores riscos globais pelo Fórum Econômico Mundial, é foco de diversos movimentos e protestos sociais, além de estar causando efeitos que estão sendo sentidos no mundo todo (e.g. aumento da frequência de desastres naturais e temperaturas extremas).


Assim a grande questão da atualidade vem sendo construída aos poucos: como lidar com a emergência climática? Questão complexa, profunda e que se conecta com muitas outras crises enfrentadas pelos seres humanos: fome, pobreza, instituições ineficientes, desigualdade social, degradação ambiental, etc. Para lidar com essa questão há a demanda por estratégias inovadoras e ações que reinventem a relação homem-natureza e garantam o bem-estar humano intergeracional em todas as suas formas. Nesse processo, a sustentabilidade e o desenvolvimento sustentável aparecem como conceitos-chave, abordando as esferas econômica, social e ambiental e trazendo uma visão de longo prazo além de respeito às diversidades. 


Em resposta à demanda por ações e a partir da construção de um movimento que foi iniciado na Rio+92, foi estabelecida a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. A Agenda 2030 visa a promoção do bem-estar humano e reconhece sua conexão com a proteção do meio ambiente e o enfrentamento das mudanças climáticas. Essa agenda é um conjunto de diretrizes e objetivos para a atuação e planejamento da Organização das Nações Unidas (ONU) e de seus países membros rumo ao desenvolvimento sustentável, colocando-o como o princípio central da cooperação global. Essas diretrizes são uma narrativa para um futuro próspero desejado para a humanidade e para o Planeta, em meio a uma agenda acionável a ser alcançada até 2030. Assim, essa agenda é composta por 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e 169 metas associadas que abordam cinco perspectivas fundamentais para o desenvolvimento humano (pessoas, planeta, prosperidade, parceria e paz).


A Agenda 2030 e os ODS são pautas que também estão cada vez mais frequentes nos meios acadêmico, empresarial, social. E, como tinha que ser, o ODS número 13 - Tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos - traz metas de ações pontuais que englobam medidas políticas, sociais e ambientais para lidar com a emergência climática. Suas metas são focadas na mitigação da emergência climática e seus impactos e na fomentação de medidas de adaptação. Para tanto, o ODS 13 aborda tanto a conscientização, sensibilização, formação e educação para a humanidade, quanto a necessidade de reformular políticas, estratégias e planejamento e de se conseguir financiamento para sustentar um novo paradigma que precisaremos assumir para lidar com esse cenário de crise. Apesar de ainda haver um longo caminho pela frente, o movimento em direção a esse ODS já começou com o aparecimento de muitas iniciativas e oportunidades que geram esperança em meio a tanta incerteza: greves globais pelo futuro (Fridays for Future); desenvolvimento de Planos de Adaptação às Mudanças Climáticas por diversos países, estados e cidades ao redor do mundo; e a adoção de compromissos internacionais (ex. Acordo de Paris e a própria Agenda 2030).


Em meio ao movimento de reconhecimento da emergência climática como uma das grandes questões da humanidade, a ONU declarou a década 2021-2030 como a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (Década do Oceano). A declaração da Década do Oceano coloca holofotes no cumprimento dos compromissos da Agenda 2030, com foco no ODS 14: Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável. Essa decisão da ONU veio do apontamento da urgência de gerenciar, com sustentabilidade, as atividades no oceano, pauta fundamental para o estabelecimento da prosperidade do Planeta e que nunca recebeu a devida atenção (ex. pouco aparece nos currículos escolares; nós conhecemos mais o universo do que o fundo do mar; os ecossistemas marinhos e costeiros estão extremamente ameaçados por falta de conhecimento sobre eles, entre outras evidências). A declaração da Década do Oceano pode causar uma primeira impressão de descolamento com o movimento que vinha se formando em promover o combate à emergência climáticas. Na verdade, essas duas temáticas não poderiam estar mais conectadas: proteger os oceanos também é combater as mudanças climáticas. E vice-versa. Não é à toa que os ODS 13 (combate às mudanças climáticas) e 14 (proteção aos oceanos) estejam próximos - não só - numericamente.


Enquanto os benefícios do combate às mudanças climáticas na proteção dos oceanos são mais fáceis de serem estabelecidos, aqueles que a proteção dos oceanos trazem para o combate às mudanças climáticas acabam sendo menos intuitivos. As mudanças climáticas resultam em aumento da temperatura e nível do mar; mudança na dinâmica de correntes marinhas e na concentração de oxigênio dissolvido na água; perda de ecossistemas; e mudanças na composição e distribuição das espécies, entre outros impactos. Essas alterações prejudicam o funcionamento do oceano e afetam diretamente a saúde das populações que dela dependem. Assim, combater as mudanças climáticas é essencial para a proteção deste ecossistema. 


As ações adotadas para resguardar o oceano devem reforçar a resiliência e a capacidade adaptativa ambiental e social para lidar com a emergência climática. Para atingir o ODS 14 também é necessário combater as mudanças climáticas, assim, ele promove a integração das medidas de mudança climática nas políticas e planejamento e gerenciamento (ex. a promoção de sistemas de carbono azul, planos de adaptação, etc.) (meta 13.2); a conscientização e capacitação sobre a emergência climática (meta 13.3); mecanismos para aumentar a capacidade de planejamento e gestão relacionados à mudança climática (meta 13.b); e a implementação de compromissos de mitigação climática assumidos pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) (meta 13.a). Além disso, o aumento da capacidade de pesquisa, do conhecimento científico e da tecnologia marinha (meta 14.a) podem contribuir para o desenvolvimento da capacidade de adaptação e mitigação (meta 13.1) e para o planejamento e gerenciamento efetivos das mudanças climáticas (meta 13.b), especialmente em ilhas e países costeiros em desenvolvimento. Dessa maneira, as metas da ODS 14 e as consequentes ações adotadas para promover a saúde dos ecossistemas oceânicos e costeiros (ex. fortalecimento de capacidade humana e institucional; participação de atores sociais relevantes na formulação de políticas e gestão; promoção da transdisciplinaridade; fomento ao conhecimento científico e tecnologias marinhas, etc. - metas 14. 2, 14.7, 14.a, 14.c) permitirão ou até reforçarão o combate às mudanças climáticas.


Não obstante, é necessário reconhecer que os ecossistemas costeiros e oceânicos contribuem tanto para a adaptação climática (ex. proteção contra riscos costeiros e impactos das mudanças climáticas, como aumento do nível do mar e tempestades) quanto para a mitigação da emergência climática (ex. através do seqüestro de carbono). O oceano é um elemento essencial do sistema terrestre e têm um papel importante na regulação do clima, absorvendo e distribuindo calor. Cobrindo mais de 70% da superfície do planeta, esse ecossistema é crucial para a resiliência planetária, além de prestar serviços ecossistêmicos vitais (e.g. fornecimento de alimentos e energia, estabilidade climática, etc). O oceano é um ecossistema global que sustenta nossa existência e conecta a todos nós (inclusive aqueles que não estão na zona costeira). Dessa maneira, conservar e promover uso sustentável dos oceanos contribui também diretamente para o combate às mudanças climáticas. 


O ODS 14 visa o aumento de resiliência para os ecossistemas marinhos por meio da redução da poluição marinha (meta 14.1), restauração da saúde dos oceanos (meta 14.2), combate a acidificação oceânica (14.3), proteção de áreas costeiras e marinhas e sua biodiversidade (meta 14.5) e promoção da pesca sustentável (metas 14.4, 14.6, 14b). Essas ações diminuem os estressores que atuam sobre o oceano, aumentando sua capacidade adaptativa e a resiliência do planeta, o que culmina na mitigação das mudanças climáticas e seus impactos (meta 13.1). Ainda com foco na meta 13.1, benefícios adicionais do ODS 14 para o ODS 13 surgem da redução de riscos e vulnerabilidades e do aumento da resiliência das comunidades costeiras a riscos relacionados ao clima (ex. por meio da promoção da erradicação da pobreza, segurança alimentar, meios de subsistência sustentáveis, proteção costeira, etc.). Ainda nesse sentido, assegurar uma gestão coerente e integrada da zona costeira e oceano que utilize soluções baseadas na natureza que promovam a conservação costeira e marinha e o desenvolvimento urbano sustentável de forma integrada, é um passo fundamental para adaptação e mitigação das mudanças climáticas. 


Desta maneira, ao mesmo tempo que o combate às mudanças climáticas contribui para a saúde dos oceanos, a proteção dos oceanos alavanca o combate às mudanças climáticas. O vínculo claro, direto e recíproco que existe entre o ODS 14 e o ODS 13 nos leva a entender que ambos podem e devem ser abordados em conjunto na busca pela sustentabilidade. Assim, as iniciativas de proteção do oceano e de promoção da sua saúde devem levar em consideração e inserir em suas pautas a emergência climática. Reciprocamente, a Década do Oceano também deve ser vista como uma oportunidade para iniciativas que lidam com o combate à emergência climática e, nesse contexto, devem incorporar em suas pautas, com mais assertividade e clareza, o Oceano e os países e comunidades costeiras e insulares.




Por Marina Ribeiro Côrrea - via @bloom e conselheira da @ligadasmulherespelosoceanos. Esse texto é um produto associado ao curso YCL Brasil 2020 - Desenvolvimento de lideranças do Século XXI.


Referências

Griggs, D. J. et al., 2017. A guide to SDG interactions: from science to implementation. International Council for Science, Paris.

Le Blanc, D.; Freire, C.; Vierros, M. 2017. Mapping the Linkages between Oceans and Other Sustainable Development Goals: A Preliminary Exploration. UN Department of Economic and Social Affairs (DESA) Working Papers, No. 149, UN, New York.

Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação (MCTI). Década da Ciência Oceânica, 2020. Esse portal agrega informações oficiais sobre a Década da Ciência Oceânica e seus respectivos desdobramentos. Disponível em: http://decada.ciencianomar.mctic.gov.br/. Acesso em: 04 de junho de 2020.

Nações Unidas. Agenda 2030. Esse portal agrega informações oficiais sobre a Agenda 2030, os ODS e seus respectivos desdobramentos. Disponível em: https://nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/ . Acesso em: 04 de junho de 2020.

Singh, G. G. et al., 2018. A rapid assessment of co-benefits and trade-offs among Sustainable Development Goals. Marine Policy, 93, 223-231.

Steffen, W. et.al. 2015. Planetary boundaries: Guiding human development on a changing planet. Science 347: 736, 1259855.



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